Fórum independente vocacionado para a discussão de ideias e promoção de todo o género de eventos culturais e de intervenção cívica.
Os gatos reunem todas as Sextas-feiras, na Miragaia, em Angra do Heroísmo.
25.9.06
Feitiço
Revejo-te nela na forma como caminhas
no teu ar fino recto e decidido
na forma franca como te expões
na felicidade estampada na face
quando me encontras
e falas e afagas
o meu rosto
na facilidade com que fintas
o destino e acreditas que
o feio se pode transformar em belo
na fé inabalável que tens no amor
e na força do querer
consoante fricativa labiodental surda
símbolo químico do flúor
símbolo físico de força farad frequência
símbolo matemático de função
abreviatura musical de forte
como tu
27.8.06
Apaixono-me pela letra C
Vejo-a no teu rosto, na linha dos teus olhos, no contorno
do nariz, no traço das sobrancelhas, no limite da face, na
forma dos lábios,
quando os abres
ou fechas
e beijas;
na sombra do teu rosto
na parede do quarto,
no vidro da janela
com ausência;
nas palavras que sussurras o meu nome,
nos cabelos que te cobrem o tronco
e que em suspenso me dizem
como amar-te.
10.8.06
Rico País
Creio que os descobridores deste paraíso na América Central se aperceberam da fabulosa biodiversidade que nele se concentra e o apelidaram de Costa Rica. É também a Costa dos Mosquitos, e eu comprovei-o na Lagoa Samay, e, sem sombra de dúvida, o país com maior biodiversidade do planeta. Caminhar pela selva tem sido das experiências mais fabulosas que eu tenho tido, dada a variedade de fauna e flora que encontramos.
Recomenda-se.
31.7.06
diacrónica da caparica ou a ressaca da 1.ª viagem
Hoje partiram cedo para uma curta viagem e só amanhã poderei contar-lhes do sucesso musical dos diversos concertos do Coro da AMIT por terras romanas, dos miúdos sorridentes, meigos e de olhos profundos do Coro de Guatemala, dos bem dispostos franceses do Coro da Bretanha e dos músicos e cantores "um pouco impertigados" do Coro de Gales.
No seu regresso dir-lhes-ei do que revivi pouco mas intensamente daquela cidade, porque depois de tantas viagens, gentes e lugares já concluí que o que importa mesmo são os momentos únicos em que se apreciam, por exemplo, nas Galerias de Arte Moderna e Antiga, acompanhada de amigos, os quadros de sempre.
Judite decapitando Holofernes
de Michelangelo Merisi da Caravaggio
1597-1598
Shangai Blues de Elisa Montessori (n. Genova, 1931)
29.7.06
pequena crònica de calor e fontes
Aparte este inconveniente, insuportavel para alguns, a estada tem sido muito boa com excelentes concertos.
23.7.06
16.7.06
Cheiro a sol
o céu azul, com uns raios brancos;
o vento, pouco forte e quente;
o cheiro da terra e de sol.
27.6.06
A Carta
in "Mrs. Dalloway" by Virginia Woolf
31.5.06
"os caminhos dos nossos livros"
18.5.06
A sapientiae do nosso Doutor
Ao novel Doutor os nossos parabéns!
Transcrevemos o texto que leu na apresentação da tese:
Filosofias práticas, como são as dos autores que estudei, preocupam-se verdadeiramente com os destinos da comunidade humana, pelo que se pode muito bem concluir que, no fundo, o meu trabalho se enquadra dentro da filosofia social e política.
Esta preocupação refere-se ao sofrimento concreto de alguém com rosto próprio e toca no coração e não tanto na racionalidade. Visa a paz e a alegria da relação fraterna; por isso as minhas palavras-chave são: ACÇÃO, CORDIALIDADE, PORTUGAL, REALIDADE e SANTO.
O outro interpela-me, está à minha frente, não o posso pôr em dúvida ou entre parêntesis, reduzi-lo a uma qualquer indecisão epistemológica; seja ela qual for, a certeza intelectual é sempre mais fraca do que esta interpelação urgente que eu sinto no fundo do meu coração e que me faz verdadeiramente homem.
Perdendo, neste agir corajoso, aquilo que, supostamente, os gregos disseram ser a minha identidade («O homem é um animal racional») acabo por me encontrar na magnificência remota e, ao mesmo tempo, mais futura do meu ser: o meu transcender-me.
Agostinho da Silva tem apontamentos inesquecíveis sobre a caridade, a compaixão e o sacrifício. Insiste na «realidade da fome, na realidade da doença, na realidade do desamparo, que em milhões e milhões de pessoas é a verdadeira realidade do nosso povo»[1]. Mas é a Teixeira de Pascoaes, o poeta, que devemos ir buscar uma peça que sintetiza esta questão:
«Quem pode ser feliz enquanto houver o mal?
Quem pode ser alegre enquanto houver tristeza?
Sorrir, enquanto chora a dor universal?
Cantar, enquanto é um ai profundo a Natureza?
Quem pode ser sereno, enquanto os vendavais
Causam naufrágios, perdições e mortandades,
E enquanto os homens são injustos, desiguais,
E enquanto sobre a terra há só calamidades?...
Desce do etéreo azul, alma bondosa e forte!
És precisa no mundo e não nos altos céus.
Que tu conheças bem a noite, o mal e a morte,
Antros onde não chega o resplendor de Deus!...
Deixa os astros, Amor, e desce aos lodaçais.
Despe a túnica d’oiro, e que teu rosto belo
Fique branco de dor, fique orvalhado d’ais.
Uma lágrima é maior que o sete-estrelo!...»[2]
A alma bondosa e forte que se encontrava no etéreo azul é precisa no mundo. Conhecemos este movimento de longa data: é a descida do filósofo à caverna, lição tão antiga quanto a filosofia. Porém, quantas vezes o filósofo se recusa a descer! É por causa da famosa soberba de muitos filósofos que estes autores parece que desprezam tanto a filosofia.
Mas interessa perguntar se um filósofo que não percorre a via sapientiæ, isto é, que não desce do etéreo céu, será, de facto, um filósofo. Apetece variar a afirmação de Kaufmann em The Future of the Humanities: «A filosofia é demasiado importante para ser deixada nas mãos dos filósofos».
Se for para chamar aparência à fulgurante manifestação do mundo, estes autores preferem não ter nada a ver com a filosofia. São peremptórios ao afirmar que o primeiro contacto com o mundo não é epistemológico, mas sim afectivo. Opõem-se frontalmente a todo o tipo de identificação do ser com o pensar. Têm quase como pecado a transcendência dum sujeito face ao mundo tomado por objecto. Temem a linguagem geométrico-matemática quando esta aniquila a linguagem espiritual, mais persuasiva do que dedutiva, mais simbólica do que conceptual.
Temos, pois, um grande contraste formado entre a razão abstracta e teórica e a vontade livre, que Delfim Santos relaciona directamente com a responsabilidade face ao Outro que está à minha frente. Só há conhecimento investido na e pela acção.
Se o ser humano for definido apenas pela sua racionalidade, ao jeito do positivismo, e se aceitar ficar trancado nela em termos necessários, não há como evitar o escândalo da alteridade. É fácil chegar à violência a partir deste escândalo.
A razão gosta de leis vazias do cromatismo vital e, deste modo, muita filosofia e muita ciência partem do múltiplo para um suposto uno fundamental, caminho ensinado por Parménides, via do ser, ou via do nada, não faz diferença, porque este ser não respira nem tem nome próprio.
Mas a filosofia não tem de seguir fatalmente por esta vereda que aniquila o ser humano e o mundo, ao mesmo tempo. Os três autores, cada um ao seu modo, relacionam este vício com o erro que é considerar a realidade um único bloco homogéneo, quando é evidente que a vida tem princípios explicativos diferentes da matéria, a consciência princípios explicativos diferentes da vida e o espírito princípios explicativos diferentes da consciência.
Desde o Renascimento que o espírito vive subjugado à causalidade e às leis derivadas da utilização do método experimental. Ultimamente, o ser humano também tem sido estudado como se não passasse de um animal como outro qualquer, quando toda a manifestação cultural persiste em evidenciar que uma coisa é um instrumento, outra coisa é uma obra de arte, por exemplo.
Mesmo que este discurso fosse verdadeiro continuaria a ser contraproducente. Se o ser humano não for explicado a partir da liberdade, da vontade, da responsabilidade, da cordialidade, então a vida social torna-se um inferno. Não poderemos responsabilizar o acto imoral e injusto e a lei do «Salve-se quem puder» conduzirá à violência fascista e, no mínimo, ao capitalismo selvagem.
Mesmo que não fosse evidente que a lei verdadeira é a lei do Amor, era mais inteligente optar por ela, como se se tratasse apenas dum postulado que leva mais longe. Uma teoria é tanto melhor quanto testada pela evidência empírica moral e política. Mesmo que possa ser entendida como “ficcional”, é preferível uma ficção que floresce no Bem efectivo do que uma lei científica que conduz ao mal efectivo. Nem tudo o que é racional é razoável, tal como nem tudo o que é possível é desejável. Bem vistas as coisas, reside aqui a passagem da consciência lógico-dedutiva – a velha dianoia – à noêsis: a metanoia.
Segundo Agostinho da Silva, esta é a passagem da realidade captada (percepcionada, à maneira epistemológica tradicional) à realidade que brota (a realidade criada metafisicamente). E, com a graça etimológica do costume, acrescenta: esta é a diferença entre a metanoia e a paranóia, entre a loucura do santo e a razão que a si própria se enclausura e enlouquece. Não há conhecimento verdadeiro se não for moralizado, politizado, comprometido, humanizado.
O saber que nasce do espírito é que enforma a ciência e nenhuma dita “objectividade” é superior a esta vontade livre. A consciência precisa de uma definição prévia do sentido, que só lhe pode vir do espírito. O sentido funciona como uma crença, entendido como postulado necessário para a acção.
Os três autores que estudei consideram o santo como o ideal de humanidade. Poderá o filósofo ser santo? Não é preciso que seja, insiste Agostinho da Silva, precisamente o mesmo autor que é o maior apologeta do sacrifício. Este ponto é de elevada importância numa tese de filosofia.
É possível chegar à santidade sem a filosofia; porém, que disciplina, melhor do que a filosofia, pode destrinçar os falsos saberes da Verdade, analisando, com aquela cientificidade exigida por Agostinho da Silva, a linguagem equívoca, o reducionismo das propostas, o perigo das consequências reais deste ou daquele princípio teórico?
A filosofia tem um papel essencial na correcção dos flagelos enumerados no poema de Teixeira de Pascoais que acabei de citar; e filosofia rigorosa, analítica, feita com linguagem e método científicos, sem contemplações literárias.
E é neste contexto que Delfim Santos chamará à Faculdade de Letras a Casa da Cultura e ao curso de Filosofia a melhor ferramenta para salvar as Humanidades, no seu conjunto, da sua queda abissal, a que estamos a assistir, no cepticismo e no relativismo. É dele, aliás, a melhor definição de espírito: equilíbrio entre a razão, a vontade e o coração.
Não é preciso que o filósofo seja santo, embora custe a aceitar que a razão não se abra ao espírito, que a dianoia não dê o salto para a noêsis, que o cientista não dê lugar ao sábio. O sábio já vive um estado de sôphrosynê muito próximo da contemplação mística. Teixeira de Pascoaes refere-se quase sempre a este santo estóico que se consola nas alturas rarefeitas do etéreo céu; mas termina, como vimos, por compreender que o mártir é o santo por excelência, na medida em que tudo sacrifica à lei inalienável da compaixão.
17.4.06
Balada para a Trégua Possível
Tão próxima a colheita!
Tão afável o dia!
(Um gnomo verde espreita
tua figura esguia).
Tão claro e manso o rio!
Tão distante o horizonte!
(Um véu de névoa e frio
veste de espanto o monte).
Tão próxima a partida!
Tão cedo para a morte!
(A secreta ferida
da vária, esquiva sorte).
Tão para pouco o amor!
Tão solitário o medo!
(Entre o mar e a flor,
desvendo o teu segredo).
No seio do fruto estás,
sorridente e igual.
Quase humano e animal
ansioso de paz.
Igual e sorridente,
permaneces ainda
no seio da trégua finda.
E tudo é diferente.
Mais lúcido o metal
das espadas coroa
a divina pessoa
que em ti, serena e igual,
espera desde criança,
no país ocupado,
o som claro e doirado
da trombeta da esperança.
Daniel Filipe
13.4.06
Balada para a Trégua Possível
Como açucena, abre-se o teu rosto
por sobre o doce, tímida paisagem:
serena imagem
na manhã de Agosto.
Como magnólia, vertes o perfume
das tuas ancas sobre o pinheiral:
ávido fume.
casto e sensual.
Como pinho selvagem, te recebo
e amo no chão de areia ensolarado:
ingénuo efebo
deslumbrado.
Daniel Filipe
6.4.06
Balada para a Trégua Possível
Em tuas mãos obreiras nascem flores.
Em teu sexo germinam alvoradas.
manhãs de outono sem clarões de espadas
riso, perfumes, cores.
Daniel Filipe
4.4.06
Balada para a Trégua Possível
E, de novo, nos damos, nos propomos
como pássaros livres e seguros
de pertencer-lhes o sabor dos pomos.
Daniel Filipe
31.3.06
Balada para a Trégua possível
Andorinha secreta de um verão,
que só nós dois sabemos, te revelas.
De que longínqua e solitária estrela
vieste iluminar-me o coração?
De que planeta ainda inominado?
De que mistério astral, corpo solar,
patagónia celeste, ignoto mar,
provém o teu perfil sereno e amado?
Daniel Filipe
29.3.06
Balada para a Trégua Possível
Que sinal tua mão
ergueu, fácil, no escuro?
Que pressago ou impuro
simbolismo pagão
Que mistério odiado
no teu corpo imaturo!
Nem pressago ou impuro
rósea chaga do lado.
Daniel Filipe
24.3.06
20.3.06
Balada para a Trégua Possível
Um amor como este
não pede mar ou praia:
somente o vento leste
erguendo a tua saia.
O resto é o futuro
além, à nossa espreita:
doce fruto maduro
na hora da colheita.
Daniel Filipe
17.3.06
Balada para a Trégua Possível
Uma cigarra (obrigatório tropo!)
canta, em teus seios pousada.
uma réstea de vida. Um quase nada.
Musical e alada
discípula de Esopo.
Daniel Filipe
16.3.06
Balada para a Trégua Possível
Em teu macio olhar repousa o meu.
E na face polida assim formada
se reflecte e recria o próprio céu.
Daniel Filipe
14.3.06
Balada para a Trégua Possível
Esta é a trégua possível, merecida,
gerada no teu ventre de mulher.
Beijo, adiado, a tua face, vida!
E deixo, livre, o coração bater.
Daniel Filipe
3.3.06
23.2.06
26.1.06
If the worst comes to the worst
18.1.06
Go fly a kite!
12.1.06
to have a skeleton in the cupboard
(
11.1.06
10.1.06
Get off and milk it!
in A Dictionary of Contemporary English. Pan Books
9.1.06
Any day of the week
in A Dictionary of Contemporary English. Pan Books
6.1.06
LUZ
tu não tenhas morrido
e talvez nesse livro não escrito
nem tu nem eu tenhamos existido
e tenham sido outros dois aqueles
que a morte separou e um deles
escreva agora isto como se
acordasse de um sonho que
um outro sonho (talvez eu),
e talvez então tu, eu, esta impressão
de estranhidão, de que tudo perdeu
de súbito existência e dimensão
e peso, e se ausentou,
seja um sonho suspenso que sonhou
alguém que despertou e paira agora
como uma luz algures de lado de fora.
MANUEL ANTÓNIO PINA (1943)
Os Livros
5.1.06
M y Life and My Love
M y Life and My Love
My life and my love, like a passing storm
Flashing, and clashing and thrashing about
No solace of heart, in me, tends to form
The brighter my day, the darker my doubt
My love's rainbow is scarcely seen by eye
Glowing, and flowing and growing in me
Till it fills and floods and shoots out my side
Far enough, high enough, so she can see
The storm recedes and is forever gone
Gliding, and striding, and hiding for good
So too my life, my love so nearly drawn
Much closer than any that ever could
Oh, pierce the soul, pierce the depth of her heart
Detecting, connecting, injecting me
Hand in hand, we're running to a new start
Where you, I and a world of love will be
William Shakespeare
Copyright ©2006 William Shakespeare